Na minha juventude dancei todos os ritmos, em quase todos
os fins de semana, prolongados. Só me esqueci de tirar o tempo para dançar comigo
para olhando em seus olhos lhe perguntar da juventude, mas ele passou
desdenhando de mim e me envelheceu.
Hoje de soslaio e envolvido de uma brisa amena, de
vez em quando me olha com o rabo dos olhos; e disfarçadamente como quem
quisesse dar-me um exemplo ou mesmo um conselho, agita as folhas amarelecidas e
as derruba ao chão.
Eu entendo perfeitamente a mensagem desse meio desdenhoso
tempo, mas ele é compreensivo e não aponta as marcas no meu rosto da sua
passagem por mim; nem eu o culpo por nada, porque não tenha consciência do mal que
me faz.
Passa correndo, seu ritmo é esse de passar correndo sem
olhar para trás, mas foi absolutamente cortês comigo um dia deixando-se ver o
futuro envolvido pela brisa perfumada, quando seria primavera, retornando
ainda com as cores e perfume, ao presente outono.
Demonstrou grande apreço por minha pessoa, coisa de que
não tenho noticia de amigos que tivessem gesto semelhante, nem solidariedade;
mas aprendi com ele certo desdém, pois também a ele ninguém presta atenção
quando passa!
Mas de todas as coisas, das quais o tempo dispõe, à
memória ainda conserva sob a minha custódia; e à saudade mantém cada sempre
viva; ainda que ironicamente seja alimentada de lembranças não exatamente
mortas, mas já passadas, de modo que sempre leva quando vai embora um pedaço da
parte que hipoteticamente me pertencera.
As coisas idas e passadas é verdade que as leva, porém
nas mortas é que reside a raiz mais profundamente viva, e daí nasce estranhamente
a essência melancólica do canto lírico!
Essa doce e irremediavelmente triste canção da saudosa
alma humana que partiu tecida de tédio e recordação, quando bem cantada remoça o
coração de quem ouve, embora irredutível envelheça o rosto e as mãos, que pela
ordem é onde mais agudas são das rugas; e também a incerteza e falta de
destreza, mãos trêmulas.
Homenagens não há que chegue para agradecer o tempo,
esse impostor que mesmo não existindo transforma e promove a reforma das
instituições, enquanto não for possível extinguir algumas pessoas que nelas
parasitam.
Outras nunca deveriam ser instituídas, principalmente
onde em congressos se reúnem simulacros de homens que se dizem políticos e umas
poucas, para não dizer pouquíssimas entidades e fundações, razão pela qual nunca
deveriam fechar as suas portas, nem deixar de existir, para que de eterno
fossem revestidas e o tempo não pudesse levar seus tesouros com a marca do homem
não simplesmente grande, mas homem, apenas homem.
Mas em razão dessas memoráveis e veneráveis calo-me.
Já diante daquelas outras numerosas e quase malditas instituições eu dissesse aos
seus mentores que certa vez tirei o tempo para dançar, essas “pessoas” inconscientes
da sua não existência acreditariam, devido à necessidade de um motivo fútil
para negá-lo depois.
Pois quem não sabe que o tempo não existe não o vê,
nem sabe que ao passar pode até soprar e se esconder no vento para limpar a
velha árvore despindo-a das folhas mortas que reviverão para adubar o velho e mal
tratado chão, coisa que os vendilhões do templo e do tempo nem percebem. Ao
contrário deste rito simples e honesto do tempo e da natureza, pelo uso espúrio
constante que fazem deles se perpetua a mentira, para dar eternidade ao tempo
já morto e ao falso homem que atormenta o verdadeiro.
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