Todos os objetos ao alcance
de minha percepção adquiriram um tom muito escuro, perderam os contornos que
definiam as formas agradáveis e as cores desbotaram.
Em meio ao caos do panorama mundial, a única visão deveras
esperançosa passou por mim ainda há pouco no olhar inquietante de uma criança.
Querendo-me dizer alguma coisa, olhou-me sorrindo;
mas atrás daquele sorriso inocente vi um infantil desassossego, que uma alma
adulta de formação ocidental como a minha talvez tenha dificuldades para compreender.
Ante este infantil olhar tendo por trás como pano de
fundo o estranho quadro do mundo, apequeno-me estarrecido a perguntar: onde
teria ido parar a razão e a caridade? Temeroso, onde encontrar a esperança?
No âmago da minha pessoal pretensão já não tem
importância a minha inquietude nem desejo coisas, e o meu tempo de vida e a
ilusão são já muito modestos em longitude; mas a civilização ocidental é ainda jovem
e passa por um momento de insanidade coletiva, onde as pessoas realmente
preocupadas com os valores morais trazem abafadas as suas vozes.
Certamente isto passará, mas quantas vidas isso já
custou e ainda poderá custar? E quantas chagas na alma e distorções na personalidade
da consciência coletiva isto corromperá? Que o retorno ao equilíbrio voltará
sim voltará, mas não demore, que uma profunda contaminação pode atingir os já
poucos ambientes sadios e as águas poluídas engolir o terreno ainda sadio e
fértil.
Parece que de fato são chegados os tempos esperados,
mas não deveria ser desta triste forma envolvendo crianças!
As alternativas reduziram-se a duas correntes
perfeitamente delineadas na base da pirâmide. De um lado uma multidão correndo
atrás da comida e da salvação, sem saber do que se salvará; e do outro lado
outra metade em sofreguidão acumulando bens perecíveis, muitos roubados do povo
pelos simulacros de presidentes, com que pensam construir altas muralhas a fim
de proteger-se atrás delas.
O meio pelo qual adquirem os seus bens, não vem ao
caso comentar, todavia raros são aqueles por meios lícitos e honestamente
adquiridos quando políticos.
Felizmente ainda existe uma elite espiritual, muito
bem preservada das tormentas, é claro que existe! E em último caso os seus
membros servirão de semente para uma nova civilização; mas a inquietação é
grande, porque são poucos e até se podem contar nos dedos de meio milhar de
mãos, e até dentre estes no caso brasileiro, um ou outro faz o jogo do traidor!
Ainda bem que a vontade destes gigantes mentais é
muito poderosa e produz admirável corrente espiritual! E o melhor de tudo é que
se escondem no meio da multidão e não trazem marcas na testa! Podem proteger-se
também porque aprenderam a arte da mística proteção, que os malfeitores da vida
não conhecem!
E também há de ainda prevalecer até entre os mais
rudes um frágil sentimento de amor às crianças, pois elas haverão de ajudar a
salvar o mundo e a repovoar a terra de boa semente, juntamente com as almas
simples, que não acumulando pesos de nenhuma ordem pairam acima da superfície
caudalosa das águas contaminadas.
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