Passagem breve
A voz dos anjos, caso os anjos tenham voz é a que gostaria de ouvir
neste momento; mas porque não a ouça talvez não tenham voz, e não a ouço por eu
não merecer ouvi-la. E o tempo, o senhor da razão e do juízo resolve esse silencioso
incomodo.
Responder-me-á ele, por que não estou a ouvir a voz dos anjos caso
eles tenham voz?
Contudo, apesar de ainda ou já doer-me o corpo, há no tempo algo muito
bonito que se apresenta em formas concretas e abstratas de arte, e até os anjos
aí ganham uma voz metafórica e vai em silêncio! E assim, diferente de mim, se
alguém um dia já a ouviu, qual seria o motivo para não a ouvir hoje, caso como
eu não a ouça agora? Talvez se a ouça um dia se de fato eles tiverem voz, ou
mesmo agora caso prestando sentido na passagem do tempo se dê voz ao silêncio.
Pois sim, tudo passa, tem começo, meio (e
porque é algo no meio de tudo e tudo é meio relativo) tem também fim. O fato é
que tudo passa e nem tudo passa por mim. Não, não sou medida para nada, cânone
de nenhuma forma, nenhum exemplo digno de ser copiado; sou no máximo um corpo
falante que vai por aí. Às vezes sem rumo, sem destino, embora onde eu me
encontro haja um modesto jardim... Sem flores nem rosas que o tempo até já as
despetalou... Mas ainda dos espinhos há os sinais antigos e as boas novas já
não ferem por temer o novo; e se vierem a ferir-me um dia, não poderia
senti-las por já de terem passado. Mas ainda espero e sempre haverei de esperar
antes de passar ouvir a voz dos anjos.
Responder-me-á ele, por que não estou a ouvir a voz dos anjos caso eles tenham voz?
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